terça-feira, 5 de abril de 2011

O retorno da lendária Lotus



O esporte a motor está ligado desde os seus primórdios à indústria automotiva. Fabricantes usam as competições como meio para o desenvolvimento de tecnologias e materiais, além disso o esporte a motor é um universo simbólico atraente para o marketing dessas empresas. É muito interessante, em termos mercadológicos, vincular uma imagem vencedora, esportiva e masculina às marcas e aos produtos automotivos. Algumas equipes de competição também fazem o caminho contrário ao se tornarem fabricantes de automóveis de passeio esportivos, trazendo das pistas as bases de sua estratégia de negócio: conhecimento técnico e um imaginário simbólico de sucesso.

Um dos melhores exemplos desses laços entre competição e a indústria automotiva é a Lotus. A marca nasceu das mãos de Collin Chapman em 1947. Quando ainda era estudante de engenharia na Inglaterra, Chapman criou o seu Lotus Mark I, um carro desenvolvido para competições de trial e que usava a mecânica do Austin Seven. A partir daí uma série de outros carros artesanais para competições se seguiram, até que em 1952 o engenheiro inglês e sua mulher resolvem criar a Lotus Enginering Co. A empresa passa então a fabricar seus esportivos de forma mais industrial. Em 1957, Chapman tenta a sorte como piloto na Fórmula 1, guiando um Vanwall. No ano seguinte a Lotus entra definitivamente na categoria com o seu primeiro monoposto, o Type 12, que possuía um revolucionário sistema de suspensão. Outras inovações tecnológicas marcaram a passagem da Lotus pela F-1, principalmente as relacionadas a aerodinâmica. A mais marcante delas foi o famoso carro-asa onde a forma do assoalho e do aerofólio aumentavam a velocidade nas curvas.

Além de desenvolver grandes máquinas, a Lotus ficou também marcada por seus grandes pilotos. A equipe original competiu de 1958 até 1994 e o período mais vitorioso foi sem dúvida os anos 60 e 70. Foi nessa época que a equipe conquistou os seus 7 títulos como construtora e os seus 6 títulos de pilotos com Jim Clark (1963 e 1965), Graham Hill (1968), Jochen Hint (1970), Emerson Fittipaldi (1972) e Mario Andretti (1978). Desses pilotos, o mais emblemático é sem sombra de dúvida Jim Clark. Além de ser o primeiro piloto a ser campeão pela Lotus, Clark passou toda a sua carreira na Fórmula 1 correndo pela equipe. Foi ele também que conquistou a primeira vitória da Lotus nas 500 milhas de Indianápolis, no mesmo ano em que se tornaria bicampeão da F-1. Essas incursões da equipe pelos EUA e suas vitórias foram marcantes para a história do automobilismo. Não apenas por ter sido uma equipe européia  vitoriosa do outro lado atlântico, mas principalmente por ter popularizado a propulsão traseira nos monopostos utilizados nos Estados Unidos.




Com todo esse valor histórico, não é de se estranha que quando a marca Lotus resolva voltar para as competições de fórmula, escolha as cores emblemáticas do carro que foi pilotado por Jim Clark. O ano escolhido para o retorno foi 2010, após a crise econômica que assolou a indústria do automóvel e forçou a debandada de vários fabricantes em diferentes tipos de esporte a mortor. Na Indy, a Lotus passou a ser patrocinadora de Takuma Sato na equipe KV. Na Fórmula 1, a marca retornou pelas mãos do malaio Tony Fernandes que montou uma nova equipe com o nome e o também clássico verde e amarelo da Lotus.

Em 2011, a presença da Lotus de certa forma se ampliou. Na Fórmula 1, o desentendimento entre a Proton, fabricante malaia atual proprietária da Lotus Car, e o empresário Tony Fernandes gerou a criação de duas equipes com o mesmo nome Lotus. A equipe de Fernandes teria os direitos de uso da marca Team Lotus (a antiga equipe de F-1) que seria de propriedade dos herdeiros de David Hunt, um ex-piloto. Já a fabricante de esportivos Lotus Car resolveu patrocinar a equipe Renault que foi comprada pelo grupo de investimentos Genii. A equipe agora se chama Lotus Renault e a montadora malaia dona da marca foi a justiça inglesa para retirar os direitos de Tony Fernandes. Apesar de terem um nome em comum, a diferença entre essas equipes é gritante em termos de performance, além de usarem cores bem diferentes. A pequena e fraca Team Lotus manteve as tradicionais cores verde e amarela usadas nos anos 60. Já a grande Lotus Renault  buscou inspiração nos carros dos anos 70, com o preto e o dourado da John Play Special, patrocinadora da Lotus naquela época.

A Indy teve também um aumento significativo na presença da Lotus. A parceria com a KV foi estendida e agora além de Takuma Sato, os pilotos Ernestro Viso e Tony Kanaan levam o verde e amarelo da marca inglesa de esportivos. O envolvimento simbólico é ainda maior no carro de Kanaan. O brasileiro tem em seu carro o número 82, o mesmo que Jim Clark usou na sua vitoriosa participação nas 500 milhas de Indianápolis em 1956. E parece ter dado sorte a Tony, já que o piloto terminou em terceiro no primeiro GP do ano.

Esse envolvimento da Lotus com a Indy vai ser ainda maior a partir de 2012. O novo regulamento da categoria levou ao desenvolvimento e adoção de um novo carro (que é padrão para todas as equipes) que poderá receber pacotes aerodinâmicos desenvolvidos por diversas empresas. Uma das que se interessaram é a própria Lotus. Além dos kits a empresa será uma das fornecedoras de motores para categoria, disputando espaço com a Chevrolet e atual fornecedora, a Honda.

Temos então uma marca com todo um histórico de sucesso e envolvimento com o esporte a motor. Retornando em um momento importante e muito interessante. Além de aproveitar o espaço aberto com a debandada de vários fabricantes da F-1 e da Indy, a Lotus Car está preparando o lançamento de novos carros esportivos de passeio para os próximos anos. E nada melhor que reforçar o caráter de esportividade e velocidade de seus produtos com a imagem de competições que trazem justamente esses valores. Uma ligação que não é superficial, não apenas porque existe toda uma memória relacionada a participação de sucesso da equipe Lotus nos anos 60 e 70, mas também porque a empresa por trás da marca se envolve diretamente com a parte de desenvolvimento tecnológico dessas categorias.


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